por Igor Gasparini
Neste último final de
semana (9 e 10), o Teatro Alfa (SP) recebeu a companhia de dança dirigida por
Bruno Beltrão. O Grupo de Rua, reconhecido
internacionalmente, apresentou o espetáculo Crackz
e trouxe a referência tecnológica do termo para o corpo. Em processo coletivo
de observação de ações cotidianas, os intérpretes selecionaram aquelas que os
motivavam a copiar para então construir um trabalho que espanta pela fisicalidade.
Corpos fortes e com uma presença
cênica característica do hip hop, não resultam em um espetáculo de danças
urbanas, mas em um trabalho contemporâneo que investiga e se constitui por um
vocabulário único desenvolvido pelo coreógrafo de Niterói (RJ). Justamente por
esse diferencial, o Grupo de Rua ganhou
espaço nos principais eventos de dança do mundo, apresentando-se em mais de 20
países da Europa, Ásia, América do Sul, América do Norte e África, com destaque
para NRW International Dance Festival (2008),
dirigido por Pina Bausch.
Um misto de força e
equilíbrio; giros e mais giros; no plano alto e baixo; refletem o potencial que
o corpo tem em sua fisicalidade extrema. Mas esse corpo não transmite apenas dança, é a própria mídia de si mesmo (à luz
da Teoria Corpomídia, KATZ e GREINER),
revelando muito da história de cada um, da origem da companhia e da cultura hip
hop.
Todo corpo, humano ou não,
existe e pode ser chamado de corpo quando puder ser identificado por uma
coleção circunscrita de informações que não para de se transformar. “Meio e
corpo se ajustam permanentemente num fluxo inestancável de transformações e
mudanças” (KATZ e GREINER, 1998, p. 91). Sendo cada corpo mídia de si mesmo, isto
é, do conjunto circunstancial de informações que o torna corpo, é possível
afirmar que os processos de comunicação nele não se estancam, visto que o fluxo
de trocas entre corpo e ambiente é constante.
Cabe destacar o aspecto
comunicacional implicado no modo “como o movimento se especializa a ponto de se
transformar em representação teatral, gesto musical, dança, acrobacia,
performance, música, ou seja, suas ações no mundo em forma de arte” (KATZ e
GREINER, 1998, p. 94). Mais um espetáculo de dança, mas é pelo, e através dos
corpos, que se vê muito mais que isso: nota-se a cultura hip hop e seu poder
questionador; a afirmação do eu no mundo; a luta pela igualdade sócio-racial...
Assim, ao assistir ao trabalho de Bruno Beltrão, você se depara com a realidade
de como transformar talento em arte, levando ao mundo um recorte do Brasil; um
recorte muitas vezes velado. Diferentemente do próprio nome da cidade de
Niterói (do tupi “Água que se esconde”),
aqui, é o inverso, é na revelação do potencial artístico e de vocabulário
próprio do Grupo de Rua que os
colocam em sintonia com os grandes trabalhos contemporâneos da atualidade.
Referências:
KATZ,
H. Corpomídia não tem interface: o exemplo do corpo-bomba. In Corpo em Cena.
Volume 1. São Paulo, 2010.
KATZ,
H.; GREINER, C. A natureza cultural do corpo. In Lições de Dança 3. Org.:
Silvia Soter Roberto Pereira. Rio de Janeiro: Univercidade, 1998.
__________. Visualidade e imunização: o inframince
do ver/ouvir a dança. Anais do II Congresso Nacional de Pesquisadores em Dança.
São Paulo, 2012.
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